Pensata do Naza

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sexta-feira, agosto 26, 2005

O que aprender com os erros de Lula

O texto abaixo foi escrito pela reporter Malu Gaspar, da revista Exame (retirado de http://portalexame.abril.uol.com.br/edicoes/850/economia/conteudo_88184.shtml)

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O que aprender com os erros de Lula
26.08.2005

Especialistas apontam os cinco pecados capitais do presidente na gestão da crise política


Se fosse o principal executivo de uma empresa em crise, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria em sérios apuros -- possivelmente sob risco de demissão, dado o histórico de erros cometidos desde a eclosão do escândalo do mensalão. Qualquer negócio ou país está sujeito a passar por dificuldades. A diferença entre um bom e um mau líder está em como reage a esses abalos. A história empresarial está repleta de exemplos de presidentes que aproveitaram as crises não apenas para salvar a credibilidade de sua organização como, em alguns casos, para ganhar mercado e melhorar sua imagem diante da opinião pública. "Na hora de enfrentar os problemas, credibilidade é tudo, tanto na política como na administração", diz Ramiro Prudêncio, diretor da consultoria Burson-Marsteller no Brasil. "Há muito o que aprender com os erros de Lula."

Nas últimas semanas, EXAME foi buscar a opinião dos mais importantes especialistas em gestão de crise do país. Eles identificam cinco erros centrais do presidente Lula na condução da crise -- todos facilmente evitáveis. Para esses especialistas, a entrevista coletiva concedida pelo ministro Antonio Palocci logo depois das denúncias de seu ex-secretário, Rogério Buratti, serviu como contraponto à ação de Lula até agora -- de certa forma, Palocci fez exatamente o que Lula deveria ter feito. "Ele mostrou que não adianta fazer vista grossa, porque a crise não desaparece", diz Prudêncio. Para quem pretende aprender com os equívocos do presidente, no entanto, é preciso atentar para a mais poderosa das lições. "Uma boa gestão de crise só funciona quando não se tem nada a dever", diz Eduardo Prestes, da Fundação Getulio Vargas. "Caso contrário, tudo o que se conseguirá é diminuir prejuízos."

Erro 1
Não solucionar um problema que pode virar uma crise
O primeiro erro de Lula foi não atentar para uma série de evidências de problemas que se acumulavam em seu governo. A primeira delas foi o vídeo que mostrou o ex-assessor parlamentar Waldomiro Diniz pedindo propina a um dono de casas lotéricas para pagar despesas de campanhas do PT -- além, é claro, de reivindicar uma porcentagem para o próprio bolso. A segunda evidência veio da boca do deputado Roberto Jefferson, que afirma ter avisado o presidente sobre a existência do mensalão em duas ocasiões. Naquela época, a opinião pública nada sabia sobre a existência de um esquema de corrupção envolvendo quadros do PT e o publicitário Marcos Valério. Com uma ação rápida, a crise poderia ser minimizada.

"A maior parte das crises é previsível e tem origem em problemas latentes", diz Prudêncio. "Talvez o fato de o caso Waldomiro ter terminado sem abalo tenha favorecido a percepção de que estava tudo resolvido." A história empresarial recente é plena de episódios semelhantes. Em 1994, por exemplo, a Intel, maior fabricante mundial de chips, pagou caro por ignorar sinais evidentes de uma crise em formação. A empresa descobriu uma falha num chip do microprocessador Pentium que só se manifestava uma vez a cada 27 000 anos-luz de uso contínuo. O então presidente, Andy Grove, optou por usar a tática do avestruz: simplesmente fingiu que o problema não existia e continuou a vender seus chips. A falha, porém, foi descoberta por uma comunidade na internet e divulgada pela mídia. A Intel teve de recolher centenas de milhares de peças, registrando prejuízo de 475 milhões de dólares.

Erro 2
Demorar a admitir a existência de uma crise já instalada
"A primeira reação de um líder é negar problemas em sua organização", diz Prestes, da Fundação Getulio Vargas. "Afinal, se ele chegou ao topo cheio de méritos, por que agora estaria errado?" Admitir a crise e reagir imediatamente nem sempre é fácil, mas trata-se de uma espécie de mandamento para quem é afetado por denúncias. "Ao demorar para reagir, Lula quebrou uma regra importante -- quando você é visto como um problema, tem que se apresentar rapidamente como parte da solução", diz Prestes. A crise política foi desencadeada em meados de maio, quando eclodiram as primeiras denúncias de corrupção nos Correios. Ao ser abordado, o presidente Lula reagiu com ironia: "Olha para a minha cara para ver se estou preocupado". A primeira entrevista sobre o tema só foi dada dois meses depois, em julho, a uma jornalista freelancer de uma TV francesa -- numa tentativa clara de fugir de perguntas incômodas. Novamente, a saída foi tentar negar -- ou pelo menos minimizar -- os problemas. "O que o PT fez é o que é feito no Brasil sistematicamente. Não é por causa do erro de um dirigente ou outro que você pode dizer que o PT está envolvido em corrupção", disse Lula.

Erro semelhante ao de Lula foi cometido pela Nike, maior fabricante de artigos esportivos do mundo, em 1995. Na época, a empresa foi acusada de negociar com fornecedores asiáticos que utilizavam mão- de-obra infantil em suas fábricas. A cotação das ações da Nike despencou. A empresa, no entanto, passou um ano tentando mostrar que não tinha responsabilidade sobre o caso. Só quando decidiu constituir uma comissão independente para revisar todos os contratos e estabelecer parâmetros para seus fornecedores a Nike começou a sair da crise.

Já a reação da Petrobras à crise provocada pelo afundamento da plataforma P-36 é apontada como exemplar. Assim que foi avisado sobre o acidente, o então presidente da empresa, Henri Reichstul, transferiu-se para Macaé para conhecer as circunstâncias do acidente, reforçou a equipe de jornalistas para prestar contas ao público e pediu desculpas pelo ocorrido pessoalmente aos parentes das vítimas.

Erro 3
Encobrir informações sobre a crise
Nos últimos quatro meses, esconder informações do público mostrou-se um péssimo negócio. Vários dos personagens que tentaram encobrir fatos acabaram desmentidos, muitas vezes em poucas horas. Foi o que ocorreu com o ex-presidente do PT José Genoíno ao negar conhecer o empréstimo feito ao partido pelo banco BMG com aval de Marcos Valério. Diante da divulgação do documento, assinado por ele, teve de voltar atrás. Já o ex-ministro José Dirceu afirmou só ter se encontrado com Valério em eventos sociais -- mas sua agenda na Casa Civil mostrava o contrário. Por enquanto, é difícil saber exatamente quanto Lula sabia de todo o escândalo -- a estratégia do governo tem sido tentar isolá-lo de tudo. Mas são crescentes as suspeitas de que nem tudo tem sido levado a público. Um exemplo: o ex-líder do PL Valdemar da Costa Neto confessou ter negociado, em 2002, apoio do partido à candidatura petista em troca de 10 milhões de reais numa reunião no apartamento do deputado Paulo Rocha, do PT. Valdemar, que renunciou ao mandato, disse que Lula estava no apartamento e sabia dos termos da negociação. O anfitrião Paulo Rocha confirmou a presença do presidente no encontro. Até agora Lula não explicou se sabia ou não da negociação.

O caso que levou à falência da gigante americana Enron tornou-se um exemplo clássico de ocultação de escândalos no mundo empresarial. Os executivos da companhia imaginaram que fraudes nos balanços poderiam esconder os problemas financeiros e animar investidores. Quando a verdadeira situação tornou-se pública, já era tarde demais para qualquer plano de recuperação. Outro caso foi o da gigante dos seguros MetLife, acusada em 1993 de ludibriar clientes ao vender seguros de vida disfarçados de planos de previdência. A empresa negou saber da prática de seus corretores, mas as investigações mostraram que os executivos não apenas tinham conhecimento como eles próprios ensinavam aos corretores a melhor maneira de enganar os clientes. Em 1999, a MetLife concordou em pagar mais de 2 bilhões de dólares em multas e indenizações.

Erro 4
Comunicar-se de maneira equivocada
"Diante de uma crise, um político ou um alto executivo precisa saber se comunicar de acordo com a seriedade do momento", diz o professor Gaudêncio Torquato, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Desde a eclosão do escândalo em Brasília, a comunicação de Lula tem sido errática. Depois de dizer, no início de junho, que o governo "cortaria na carne" e não acobertaria ninguém, o presidente decidiu partir para o desafio. "Ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que eu para fazer o que precisa ser feito", disse. O tom desagradou boa parte da opinião pública, que esperava mais humildade diante de tamanha crise. A frase seria repetida outras vezes, até o discurso do dia 12 de agosto, quando Lula, de cabeça baixa e apoiando-se num discurso escrito, pediu desculpas à nação e disse ter sido traído. O pedido de perdão, porém, soou pouco convincente à maioria pela falta de ênfase e de informações objetivas.

Para Prudêncio, da Burson-Marsteller, é preciso tomar cuidados especiais quando é o presidente quem fala -- caso contrário, a opção pode se mostrar desastrosa. Foi o que viveu a Exxon, empresa americana do setor de petróleo. Meses após o derramamento de 42 milhões de litros de óleo no mar do Alasca, em 1989, o presidente do conselho de administração, Lawrence Rawls, decidiu finalmente ir à TV prestar contas à sociedade. Levou um dossiê de 400 páginas sobre a tragédia. Quando a apresentadora perguntou o que havia no relatório, ele respondeu: "Acho que você não entende bem o papel de um presi dente. Eu não leio esses informes, tenho quem faça isso por mim". A atitude de pouco-caso diante do ocorrido manchou ainda mais a imagem da empresa -- e o acidente custou à Exxon 8 bilhões de dólares só em multas e indenizações.

Erro 5
Não ter um plano para enfrentar a crise
Ter um plano de contingência previamente preparado foi essencial para que a empresa de aviação Northwest Airlines pudesse enfrentar uma greve de seus mecânicos nos Estados Unidos. A greve começou em 20 de agosto, mas até agora a empresa tem conseguido evitar atrasos e cancelamentos de vôos graças à contratação de força de trabalho terceirizada. Os clientes têm sido informados de tudo e sempre tranqüilizados de que não incorrerão em prejuízo. A lição da Northwest é simples -- para lidar com uma crise, é preciso montar uma operação especial, que dure o tempo necessário para que as coisas voltem ao normal.

Nada semelhante foi pensado pelo governo Lula. Desde o início da crise, o que se viu foi o contrário: Lula perdeu boa parte de sua equipe de colaboradores mais próximos. O secretário de Comunicação, Luiz Gushiken, alvejado pelas denúncias, perdeu o cargo. O ministro José Dirceu também teve de sair. Um de seus auxiliares mais fiéis, o ministro Aldo Rebelo, foi outro a abandonar o governo. Segundo os especialistas, Lula deveria ter montado um comitê gestor da crise. Algo semelhante ao que fez o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso durante o apagão. Na crise de energia, o governo anterior deslocou o ministro Pedro Parente para que cuidasse exclusivamente do problema. Os especialistas são unânimes em afirmar que essa decisão minimizou o transtorno causado à população. Por enquanto, Lula segue com a mesma estrutura operacional do período pré-crise. Troca idéias com alguns auxiliares, como Palocci e o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, mas não tem nada semelhante a um órgão de gestão da crise. O resultado da má operação tem sido o desencontro de informações entre as figuras mais importantes do Executivo -- por exemplo, no anúncio de Lula de que a crise poderia afetar a economia, feito poucos dias antes de Palocci afirmar exatamente o oposto --, passando a impressão de um time pego de surpresa pelas denúncias.